Diretor: José Paulo Dias Pinho Periodicidade: mensal

Entrevista ao grupo UHF

António Manuel Ribeiro

J.A. - Como surgiu a formação do Grupo e quem eram os elementos da formação inicial?
A.M.R. - Os UHF despontaram em Almada em finais de 1977, chamavam-se nessa altura À Flor da Pele, título do nosso primeiro álbum (1981). Eram quatro rapazes que mal se conheciam, mas que amigos comuns juntaram por causa da música: Carlos Peres (baixo), Renato Gomes (guitarra), Américo Manuel (bateria) e eu próprio (voz e guitarra). Mais tarde, em finais de 1979, depois do lançamento do primeiro disco – o EP (vinil) “Jorge Morreu” –, o Américo saiu e entrou o Zé Carvalho para a bateria.

J.A. - Tendo havido ao longo dos vossos 32 anos de carreira várias alterações no grupo, como é actualmente a sua constituição?
A.M.R. - Esta formação está junta há mais de uma década com o António Côrte-Real (guitarra), o Fernando Rodrigues (baixo), o Ivan Cristiano (bateria) e eu próprio. Aliás, esta é a formação mais consistente e duradoura do grupo.

J.A. - Esta questão é mais direccionada para o António Manuel Ribeiro. Qual a sensação de tocar com o seu filho na mesma banda?
A.M.R. - Vejo-o como um artista aplicado na sua arte, um excelente profissional. Ganhou o seu espaço por mérito próprio, nem podia ser de outra forma quando há uma equipa para dirigir e onde todos são igualmente importantes. Por vezes, até sou demasiado exigente com ele no contexto da banda.

J.A. - Como explicam a longevidade da banda “UHF”, pois quando do seu aparecimento, nos anos 70, a juventude apenas ouvia bandas internacionais?
A.M.R. - Há tanta matéria para responder à questão: valor artístico, novidade, atitude séria, mas, sobretudo, o valor das palavras em português a falar de um contexto nosso fizeram a diferença. Os UHF reflectem a nação portuguesa, esta sociedade, ora vogando pelo romantismo, ora tomando posição em causas comuns.

J.A. - Sendo uma banda que apenas cantava Rock em português, como conseguiram a aceitação do público, quando se ouvia maioritariamente música em Inglês?
A.M.R. - Muito provavelmente era disso que as pessoas, a juventude, estavam à espera e não de mais papagaios a rimar ‘love’ com ‘glove’.

J.A. - Quando realizaram o vosso primeiro concerto e em que local?
A.M.R. - Biograficamente está dito que foi em Novembro de 1978, mas o dia correcto não o sabemos: talvez a 15 ou 16 desse mês, num pequeno clube de Lisboa – bar É –, junto ao Hospital dos Capuchos.

J.A. - Depois de uma carreira plena de sucessos, onde têm actuado ao lado de grandes nomes da música, tanto nacional como internacional, qual ou quais gostariam de destacar?
A.M.R. - Talvez os concertos (2) mais impressivos para mim tenham sido com os britânicos Doctor Feelgood, nos dias 18 e 19 de Setembro de 1979, no Pavilhão do Dramático Cascais, local que entretanto foi demolido, mas que na altura era a sala dos grandes concertos no país. Porque foi o primeiro; porque me ganhei como músico de palco; porque o fizemos sem rede, sem sermos conhecidos, a um mês da edição do primeiro disco. Ganhámo-nos. Mas não posso esquecer o concerto do Avante de 198, à noite, porque tínhamos dado um primeiro de tarde no palco da Juventude: estavam mais de 120.000 pessoas na encosta do Casalinho da Ajuda à nossa espera – toquei arrepiado do princípio ao fim e chorei em segredo com tanta emoção.

J.A. - Qual a razão do interregno no período de 1999 a 2007?
A.M.R. - Não houve qualquer interregno. Em 2000 lancei o meu segundo álbum a solo (“Sierra Maestra”, Road Records), em 2003 os UHF editaram o duplo CD “La Pop End Rock (EMI), uma ópera rock autobiográfica; o CD “Harley Jack” (AM.RA discos), dirigido ao mundo motard, onde tocamos muito; o CD “Sou Benfica – As Canções da Águia” (AM.RA Discos/Vidisco). Em 2005 edtámos o CD “Há Rock no Cais” (Farol), com uma reedição em formato duplo em 2006. E sempre em digressão.

J.A. - Como se sentem quando, passado tanto tempo do lançamento de músicas como, “Cavalos de corrida”, “Rua do Carmo” e outras igualmente importantes, ainda continuam a serem ouvidos por diversas gerações?
A.M.R. - Ontem, depois de uma doença súbita que me obrigou a um internamento, regressei aos palcos numa terra chamada Penhascoso, que fica entre Abrantes e Mação. Na multidão comprimida, bem à minha frente, estava um grupo de jovens entre os 13 e 16 anos com uma faixa onde se lia “Os Putos de Penafiel”, e fica tudo dito. Tinham convencido os pais a deslocarem-se do norte por causa dos UHF, disseram-me no fim.

J.A. - Actualmente, têm surgido bandas que tão depressa aparecem como desaparecem. Qual a vossa opinião sobre este fenómeno?
A.M.R. - Faz parte daquilo que são os ‘movimentos da indústria’ musical: sempre foi assim e assim há-de continuar. Contudo, alguns jovens artistas põem-se a jeito, esquecendo que se o sonho comanda a vida é bom saber onde se colocam os pés. O terreno ode ser movediço sem aviso prévio.

J.A. - O que pensam sobre o panorama musical português?
A.M.R. - Vive de grandezas e misérias, e há muito tempo que é assim. O melhor é a criatividade dos artistas, mas há muita sacanice por aí à solta e à volta. E inveja; e estupidez: morremos pequenos na mania das grandezas.

J.A. - Sentem que os artistas portugueses são apoiados pelas entidades estatais?
A.M.R. - Não sei se são, mas se é disso que precisam passam para o funcionalismo público, obedientes e solícitos para a mão do subsídio. Ora, a minha definição de arte e intervenção vai no sentido oposto. Deixo uma questão nuclear: taxar o disco com o valor máximo do IVA é matar uma indústria, gozar com a cultura e fomentar a pirataria. Mas isso os políticos não aprenderam nas suas universidades fugidias.

J.A. - Quais os vossos projectos futuros?
A.M.R. - Estamos em digressão até Dezembro e editamos um novo disco de originais – “Porquê?” – em finais de Setembro. E temos projectos, de que não vale a pena falar agora. Tudo no seu tempo.

J.A. - Se alguma questão não lhes foi colocada e que queiram destacar, estejam à vontade para o fazer.
A.M.R. - Tudo OK.

J.A. - Não querendo entrar na sua privacidade, e, sabendo nós, que a vida de artista é bastante abrangente e nem sempre compreendida, onde fica a família no meio disto tudo?
A.M.R. - Por vezes ficou lá atrás, quando um homem segue um sonho teimoso num país árido. Os meus filhos estão crescidos, somos unidos, cúmplices e atentos. De resto, sou um homem convictamente divorciado, apaixonado pela vida, com vontade de desvendar este tempo que vivemos colectivamente. Com esta estada no hospital muita coisa mudou: saí diferente e ganhei-me para uma outra dimensão da vida.

J.A. - Por último, já visitou o nosso jornal “Jornal das Autarquias” on-line?
Se não visitou, solicitamos que o faça em “www.jornaldasautarquias.pt”. E opine sobre ele. Nele existe um livro de honra onde destacamos as opiniões dadas pelos nossos entrevistados.
A.M.R. - Assim farei. Muito obrigado.

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