Entrevista do Presidente da Câmara Municipal de Salvaterra de Magos

Hélder Manuel Ramalho de Sousa Esménio

J.A.-Valorize o sector primário e o turismo desse concelho?
P.C.-O Sector primário tem sido um dos principais sectores de atividade económica do Concelho, pela qualidade dos nossos solos e pela abundância de água. Para a dinâmica deste sector tem sido também, determinante o conjunto de empresários que temos e o saber que acumularam ao longo de gerações.
O Turismo tem merecido da nossa parte um olhar empenhado e procuramos desenvolver e/ou criar produtos Turísticos que depois os agentes económicos possam ajudar a divulgar e promover. A Falcoaria Real de Salvaterra de Magos, o Registo da Marca “Salvaterra de Magos, Capital Nacional da Falcoaria”, o reconhecimento da Unesco da Falcoaria em Portugal como Património Imaterial da Humanidade, a requalificação de uma antiga escola primária para “ Museu do Escaroupim e do Rio”, a construção de uma casa Tradicional Avieira, a candidatura da Aldeia de Escaroupim a uma das 7 Maravilhas de Portugal-Aldeias, e o sucesso do projeto, em parceria com a Universidade de Évora, que conseguiu classificar como Património Nacional os bordados da Glória do Ribatejo, são exemplos do esforço que vimos fazendo para evidenciar o nosso património natural e histórico-cultural.

J.A.-O que pensa sobre a violência doméstica, e das medidas recentemente tomadas, contra esse flagelo?
P.C.-A Violência doméstica é em grande medida o resultado de uma sociedade ainda muito impreparada, que só a condenação social da sua prática e as malhas da Justiça vão conseguir travar. As causas serão seguramente muitas, que o alcoolismo e as dificuldades económicas tenderão a potenciar. Esta é a razão porque alterámos o regulamento Municipal de atribuição das nossas habitações Sociais para dar a prioridade possível às vítimas de violência doméstica, a que acresce o protocolo que celebrámos com a APAV que garante o atendimento semanal no concelho e o acompanhamento necessário das vítimas.
As medidas recentemente tomadas parecem-nos sensatas e facilitadoras quer da denuncia, quer da resposta a dar à vítima, contudo, o curto período de tempo decorrido desde a sua implementação ainda não é suficiente para aferirmos da sua eficácia prática.

J.A.-Como encara a violência nas escolas?
P.C.-A violência nas escolas , seja sob a forma de violência no namoro, violência física ou psicológica, descriminação racial ou outra, bullying, etc., foram muito potenciadas pela desregulação das redes sociais, pela falta de autoridade de professores e auxiliares, pelas perdas na transmissão de valores morais e de cidadania, seja pela igreja como pela família, pela sistemática desvalorização e desculpabilização individual dos atos praticados e, não raras vezes, pelo convívio com os vários tipos de violências no seio familiar.
Não sendo expectável que a sociedade, no curto prazo, altere comportamentos, resta esperar que a Escola introduza cada vez mais conteúdos que mitiguem esta problemática e que a “Escola Segura” esteja mais presente para identificar e levar à justiça os que prevaricarem.

J.A.-Existem cada vez mais maus tratos, tanto em adultos como em crianças, incluindo violações. Quer falar sobre o assunto?
P.C.-Tenho expectativas de que os maus tratos com crianças não tenham aumentado, apenas existe um maior conhecimento, por uma mais atenta condenação social de todas essas situações.
Já em relação aos mais velhos, não tenho por certo que os maus tratos tenham diminuído, pois cada vez duramos mais, cada vez há mais gente envelhecida e com isso há um significativo acréscimo de doenças mentais, sendo elas próprias potenciadores de uma maior conflitualidade geracional, até porque quem está hoje na vida ativa tem múltiplos problemas para resolver, horários de trabalho que muitos tendem a alargar, por imposição patronal ou para conseguir os recursos financeiros suficientes à subsistência familiar.
Com a perda de espaços e tempo de convívio em sociedade, preteridos pelo acesso a múltiplos canais de diversão na TV e nos telemóveis, diminuam os laços familiares e a solidariedade/responsabilidade de tal como cuidar dos mais novos, também temos de olhar pelos mais velhos.

J.A.-Que recursos financeiros necessitam as populações mais enfraquecidas (a vários níveis) nessa autarquia?
P.C.-A proteção social das famílias e, em particular dos mais carenciados resulta do trabalho que desenvolvemos na rede social municipal que criámos e onde contamos com o apoio de IPSS’s, Juntas de Freguesia e outros parceiros.
São vários os projetos que o Município tem já implementados no terreno. Asseguramos transporte  gratuito no pré-escolar e 1º ciclo a quem viva a mais de 2,5 km do estabelecimento escolar e transporte a 100% gratuito aos alunos do 2º e 3º ciclos e agora também ao secundário. Quem ande de transportes públicos tem hoje 50% de redução dos seus passes.
A nossa Câmara Municipal no âmbito dos auxílios económicos da ação social escolar (refeições, material escolar e cadernos de fichas) comparticipa a 100% as crianças NEE’s do pré-escolar e do 1º ciclo.
De acordo com as condições socioeconómicas das famílias a Câmara Municipal disponibiliza e financia os prolongamentos de horários no pré-escolar e 1º ciclo – AAAF’s e CAF’s.
Em 2014 atribuímos 30 Bolsas de Estudo a alunos do ensino superior, esse número cresceu até 50 bolsas no ano passado. Este ano atribuímos 69 bolsas, mais do dobro do que quando aqui chegámos, e aumentámos em 16% o valor de cada uma, para ajudar cada família e mais famílias.
Estamos fortemente envolvidos, para não deixar crianças e jovens para trás, no Plano Inovador e Integrado de Combate ao Insucesso Escolar, apoiando e acompanhando jovens e suas famílias, disponibilizando mentores e treinando competências sócio emocionais.
Alargámos a todo o território os programas de ocupação de tempos livres OTL de Verão e de Páscoa (crianças dos 6 aos 12 anos) e também no Verão o projeto Empreenser (para jovens dos 13 aos 18 anos).
Para os seniores criámos o Gabinete de Apoio aos Idosos, temos a Equipa de Proteção aos Idosos, os projetos de Teleassistência, gerontomotrocidade, sénior ativo com aulas de ginástica sénior, a Universidade Sénior e os passeios e convívios de idosos e reformados.
Não devo esquecer o Balcão Social da Inclusão num protocolo com o Instituto Nacional para a Reabilitação, o Plano Municipal para a Igualdade e o protocolo de cooperação com a Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género, as Jornadas da Saúde, do Social e da Educação, o Centro Local de Apoio à Integração de Migrantes, o protocolo que temos com o Conselho Português para os Refugiados, os programas que financiamos “Vacinação contra a gripe – SNS Local”,  Rede Solidária do Medicamento e o de apoio à doença mental. Sublinhar, ainda, o papel da Rede Social Municipal, da Loja Social, do Banco Local de Voluntariado, da CPCJ e das Comissões Sociais de Freguesia.
Por último temos feito um enorme esforço de requalificação de toda a nossa habitação social a que se junta agora no âmbito da Estratégia Local de Habitação (ELH), a cooperativa NHC-Social que se propõe reabilitar 51 fogos de que é proprietária. A ELH preconiza ainda que, em 2 fases, possamos construir 24 fogos, 12 já estão projetados e estamos em processo de aquisição de terreno para os demais.

J.A.-Como reagiu essa autarquia com a chegada de imigrantes, quais as medidas que foram tomadas?
P.C.-No ano de 2008 foi celebrado um protocolo com o ACM para a criação de um CLAIM (Centro Local de Apoio a Migrantes), no sentido de responder a todas as questões relacionadas com os seus processos de legalização junto do SEF, assim como da sua integração na nossa comunidade.
Os cidadãos de nacionalidade brasileira, foram e continuam a ser a população migrante prevalente no nosso concelho. Com menor expressão segue-se a indiana e os migrantes provenientes dos PALOP.
De 2008 a 2022, foram realizados 2.539 atendimentos a migrantes.
Foi também celebrado com o CPR um protocolo para o acolhimento de refugiados, em que o município assumiu o compromisso de disponibilizar uma habitação para o efeito. Essa habitação viria a ser ocupada por uma família de refugiados (5 pessoas) oriundos do Sudão do Sul, em 2018, que, à data, se mantém devidamente integrada neste concelho.
Em 2022 o Município de Salvaterra de Magos associou-se ao desafio lançado pela Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) para criação da rede nacional de apoio aos refugiados ucranianos que queiram vir até ao nosso País, em articulação com o Alto Comissariado para as Migrações (ACM), esta rede procura identificar a resposta que os Municípios Portugueses podem dar, quer em termos de alojamento, alimentação, apoios de natureza social e emprego.
Ao mesmo tempo, a Câmara Municipal, como entidade promotora do Centro Local de Apoio à Integração de Migrantes (CLAIM), tem estado disponível, através dos seus técnicos, para o esclarecimento e encaminhamento de todas as situações de apoio aos cidadãos ucranianos.
O concelho de Salvaterra de Magos já tem tradição no acolhimento de populações deslocadas, pelo que as entidades, a sociedade civil, as Instituições Particulares de Solidariedade Social concertaram esforços no sentido de acolher cidadãos ucranianos. Com o apoio de instituições locais e famílias, foram acolhidos 49 refugiados (mulheres e crianças). Foi também articulado o trabalho em rede com o Centro de Saúde Local e com as escolas, no sentido de responder às necessidades na área da saúde e da educação, desta população-alvo.
A Câmara Municipal deliberou aplicar a isenção de taxas nas situações abaixo identificadas:
- Frequência da Piscina Municipal;
- Isenção do valor para emissão do título de Transporte (transporte escolar);
- Programas de Ocupação de Tempos livres;
- Serviços de Componente de Apoio à Família;
- Serviços de Atividades de Animação e Apoio à Família;
- Universidade Sénior;
- refeições escolares e atribuição de material escolar;

Deliberou ainda apoiar com a atribuição de refeições confecionadas ou géneros alimentares, às situações em que se comprove necessidade, mediante avaliação dos serviços de ação social e através de celebração de protocolo entre a Câmara e as instituições Particulares de Solidariedade Social.

 - Aulas de Português para Estrangeiros/ Portuguese for Foreigners
A Câmara Municipal de Salvaterra de Magos, criou uma resposta educativa, dinamizada por uma técnica do município, de aulas informais de Português destinadas a cidadãos estrangeiros que se encontrem a residir no concelho com o objetivo de facilitar a sua plena integração na comunidade local e no nosso país.

J.A.-Que medidas pensa tomar durante este mandato?
P.C.-Dar continuidade às medidas implementadas e ao trabalho colaborativo com o ACM, CPR e entidades locais, no apoio à integração dos imigrantes que venham para o nosso concelho.

J.A.-Devido à seca extrema que se passou no País durante o Verão, e agora o mau tempo que estamos a atravessar, indique-nos como está essa região a reagir a este flagelo?
P.C.-No período de seca extrema assumimos comportamentos que permitissem mitigar o consumo de água, em particular reduzindo ou interrompendo mesmo a rega de espaços verdes públicos. As situações de pluviosidade anómala que atravessámos não afetaram significativamente a vida ou a circulação neste território, muito em resultado da ação pronta da Proteção Civil Municipal e da colaboração das juntas de freguesia. Os problemas identificados foram rápidamente intervencionados e/ou foram notificados os proprietários das parcelas de terreno que tinham descuidado e limpeza de valas e de passagens hidráulicas.

J.A.-Que problemas mais prementes necessitam de intervenção rápida nessa autarquia?
O concelho passou ao lado da fixação ao território de unidades industriais, daí que o rendimento dos trabalhadores por conta de outrem esteja sempre abaixo do que se verifica, em média, a nível nacional.
O povoamento disperso, que os instrumentos de Planeamento Urbanístico não chegaram a tempo de resolver, cria-nos graves problemas no domínio das acessibilidades a zonas residenciais, agravados pela União Europeia ter deixado de co-financiar a rede viária municipal desde 2013.
Pela razão anteriormente aduzida também a taxa de cobertura do território municipal com saneamento básico está aquém da média da região, embora tenha sido possível ampliar significativamente nos últimos anos esta cobertura.
A urgente necessidade de criar 2 USF no concelho, a par da construção de um Posto de Saúde em Marinhais.
A necessidade de criar reservas de água (açudes, barragens) que possam servir o setor agrícola, pois a constante autorização de construção de furos de captação de águas subterrâneas, está a criar problemas ao abastecimento público de água potável, problemas de quantidade e de qualidade (cada vez mais sais minerais dissolvidos com enormes custos acrescidos no seu tratamento).

J.A.-Como está a situação financeira da autarquia neste novo mandato?
P.C.-A divida do Município é da ordem dos 3,5 milhões de euros, cerca de 20% abaixo da que recebemos, está sustentável e programada no tempo por forma a não inviabilizar o investimento público municipal.
Infelizmente o concelho de Salvaterra de Magos é o concelho do distrito que tem “per capita”, o menor orçamento municipal.
Era fundamental que o Governo e a ANMP fizessem a avaliação do território nacional de 40 anos da aplicação da Lei das Finanças Locais, para sabermos quais os concelhos que por força da aplicação dos parâmetros definidos na Lei das Finanças Locais ficaram prejudicados e não conseguiram atingir um estágio de desenvolvimento semelhante ao de territórios vizinhos. A verificar-se essa desconformidade, falta de coesão intra-regional, a Lei das Finanças Locais devia dispor de um fator corretivo à imagem do que foi assumido (FAM) para os Municípios sobreendividados.

J.A.-A Câmara presta apoio às juntas de freguesia?
P.C.-A Câmara Municipal estabelece todos os mandatos da gestão autárquica protocolos/acordos com as juntas de freguesia descentralizando nelas algumas das tarefas correntes que beneficiam de uma maior proximidade às populações.
Perante projetos e iniciativas de intervenção sugeridas pelas juntas de freguesia, o Município é em regra parceiro e viabiliza financeiramente o investimento.

J.A.-Que mensagem quer transmitir à população da sua Autarquia?
P.C.-Uma mensagem de confiança no futuro, pois quem trabalha (muito) no presente tem maiores probabilidades de melhorar as suas condições atuais e de estruturar um futuro que esteja mais próximo dos seus anseios. Por isso a aposta que temos feito nas pessoas (educação, cultura, desporto, etc.) e na melhoria da qualidade de vida, a que se juntam a revitalização da alteração e revisão do Plano Diretor Municipal, a promoção turística e o acréscimo de visitantes ao território são seguramente tónicos importantes para a economia local.

J.A.-O Jornal das Autarquias existe desde 2007! Quer deixar-nos a sua opinião sobre o trabalho do mesmo?
P.C.-Agradecer a oportunidade que nos dá de refletir todas estas questões e de apresentar e justificar algumas das iniciativas e dos projetos que concretizámos. É ainda um importante contributo para a valorização e consolidação do Poder Local Democrático.